EIP-1559: Análise da grande atualização do Ethereum e seus impactos

O EIP-1559 é uma das atualizações mais discutidas na história do Ethereum. Ele muda fundamentalmente a maneira como os usuários fazem lances em transações, e terá um impacto profundo na captura de valor futuro do ETH, na experiência do usuário e na segurança da rede. Esta proposta gerou um grande debate na comunidade Ethereum, com a maior parte da oposição vindo do grupo de mineradores. Em resposta, um pesquisador de criptomoedas analisou cinco cenários possíveis e acredita que a melhor estratégia para os mineradores é apoiar a implementação do EIP-1559.

Atualmente, a proposta EIP-1559 obteve amplo apoio na comunidade, e tecnicamente está pronta, com a expectativa de ser incorporada à rede principal Ethereum após o hard fork de Berlim. Após avaliar a viabilidade de várias soluções e o custo de oportunidade, descobrimos que qualquer forma de resistência radical prejudicaria mais os lucros a longo prazo dos mineradores do que a colaboração com os usuários.

Os mineradores têm uma visão otimista sobre a economia do ETH e do Ethereum

Atualmente, a receita dos mineradores vem principalmente de três fontes:

1. Recompensa de bloco de 2 ETH por bloco, além de subsídios adicionais para blocos tios;
2. O custo de licitação que o usuário paga para incluir a transação no espaço do bloco;
3. O valor extraível de mineradores é difícil de quantificar, mas extremamente alto (MEV); atualmente, a maioria dos mineradores "subcontrata" essa parte da receita a robôs de arbitragem.

Após a implementação do EIP-1559, a receita que os mineradores obtêm das recompensas de bloco e do MEV permanecerá inalterada. Enquanto o sistema não estiver congestionado, as taxas de transação serão queimadas. Quando a demanda exceder o limite máximo de taxas de gas, os usuários irão realizar lances adicionais de preços, e as taxas finais dos lances pertencem aos mineradores.

Para obter essas recompensas, os mineradores devem investir em hardware de mineração, contratos de fornecimento de eletricidade e outros gastos de capital. Esses investimentos fazem com que eles vejam estruturalmente o ETH e a economia do Ethereum de forma otimista, pois somente a mineração contínua pode gerar retornos.

Os usuários são o núcleo da economia Ethereum.

É importante notar que todas as três fontes de receita dos mineradores provêm de usuários e das aplicações e negócios que os servem. A demanda dos usuários por ETH permite que os mineradores o vendam em troca de moeda fiduciária e outros tokens do ecossistema. As necessidades de transferências, transações e empréstimos dos usuários geram taxas de congestionamento. Além disso, o uso de aplicações DeFi cria formas de MEV e outras oportunidades de arbitragem de preços para os mineradores.

Os usuários constituem a economia do Ethereum, enquanto os mineradores oferecem serviços na forma de segurança da rede. Esta é uma relação comercial, onde os mineradores prestam serviços para obter incentivos econômicos dos usuários. Os usuários não têm a obrigação moral de pagar aos mineradores um valor superior ao custo necessário para a segurança do Ethereum; da mesma forma, os mineradores também não têm a obrigação moral de continuar minerando em situações em que não conseguem lucrar.

A seguir estão cinco possíveis análises de cenários:

Cenário 1: Mineradores permanecem na cadeia antiga, não realizando a atualização EIP-1559

Em muitas outras blockchains, as atualizações muitas vezes enfrentam uma grande resistência. Isso se deve ao fato de que os usuários, se optarem por permanecer na cadeia atual, terão custos mais baixos, tornando difícil a aprovação de novas propostas.

No entanto, devido à existência da bomba de dificuldade, esta situação não pode ocorrer no Ethereum. Se não houver um hard fork para redefinir a bomba de dificuldade, a dificuldade de mineração continuará a aumentar até que a própria rede Ethereum entre em colapso. Isso torna inviável permanecer na cadeia antiga, e qualquer parte que se oponha ao EIP-1559 terá que pagar o mesmo preço para realizar um hard fork, pelo menos para remover a bomba de dificuldade.

Cenário 2: Mineradores criam tokens concorrentes e copiam o estado do Ethereum

Uma solução mais viável é os mineradores fazerem um fork do Ethereum e criarem seus próprios tokens, semelhante ao fork do ETC a partir do ETH ou do BCH a partir do Bitcoin. Se o fork faz sentido depende do custo de oportunidade de fazê-lo. Os mineradores devem escolher entre minerar uma nova cadeia competitiva e manter a cadeia existente do Ethereum.

Para pagar a receita aos mineradores, a blockchain precisa primeiro criar valor para os usuários, a fim de obter recompensas de bloco valiosas, taxas de congestionamento e MEV. O Bitcoin e o Ethereum já foram bifurcados dezenas ou até centenas de vezes, mas a maioria das bifurcações nunca obteve a preferência dos usuários. Portanto, o custo de oportunidade é muito alto.

Considerando que o estado do Ethereum é extremamente complexo, não só inclui a emissão de ETH, mas também milhares de diferentes tokens, contratos inteligentes e aplicações. Embora estes também possam ser copiados através de forks, eles são apenas uma casca em outra cadeia. Os forks não conseguem realmente replicar o valor desses ativos, e esses tokens continuarão a operar na blockchain do Ethereum EIP-1559, enquanto não terão valor na cadeia fork.

Como resultado, as aplicações DeFi que dependem de colaterais na cadeia bifurcada também perderam o seu significado, como a stablecoin DAI suportada por colaterais ou várias formas de pools AMM. Outros ativos além do ETH, incluindo infraestruturas externas importantes, como oráculos, robôs de liquidação, etc., colapsarão, causando uma grande confusão na cadeia bifurcada.

Embora em 2016 o ETC tenha conseguido bifurcar-se com sucesso do ETH, hoje não é mais possível ocorrer um evento semelhante. A ascensão de ativos tokenizados e DeFi tornou o estado do Ethereum impossível de ser bifurcado.

Cenário Três: Os mineradores criam uma nova moeda concorrente

Se o estado do Ethereum não puder ser bifurcado, e se apenas os elementos de segurança do estado do Ethereum (como a distribuição de ETH) forem copiados, o que acontece com uma moeda concorrente que começa a partir de um estado totalmente novo?

Isto é mais viável do que o cenário dois, as outras bifurcações "sem estado" do Ethereum, como Tron e a recente Binance Smart Chain (BSC), provaram isso. Em particular, o sucesso do último destacou o enorme valor de utilizar a Ethereum Virtual Machine (EVM), a infraestrutura existente de carteiras (como Metamask) e ferramentas para desenvolvedores. Além disso, embora os dapps não sejam copiados automaticamente, a sua implementação é relativamente simples, permitindo a emissão de novos ativos posteriormente.

Dada o rápido sucesso da BSC, haverá uma demanda no mercado por versões "sem permissão" que utilizam mineração PoW em vez de operadores centralizados? Novas blockchains podem até aumentar o limite de gas, direcionando-se para aqueles que atualmente não conseguem usar o Ethereum devido aos altos preços do gas.

No entanto, esta prática também apresenta vários problemas, principalmente em torno da distribuição de suprimentos.

Se a nova cadeia decidir redefinir a alocação de suprimento do Éter a partir do zero, ela perderá a vantagem da alocação de suprimento existente. Estabelecer uma nova alocação de suprimento exigirá anos de alta inflação, o que reduzirá a atratividade do ativo. Em comparação, a BSC não tem esse problema, pois a Binance é o único produtor de blocos e não precisa de incentivos adicionais de mineração.

No entanto, se a nova cadeia replicar a distribuição do ETH, uma grande quantidade de novo ETH cairá nas mãos de usuários potencialmente hostis, que podem rebaixar o preço a longo prazo. Isso fará com que as recompensas em bloco para os mineradores na nova cadeia se tornem sem valor, indicando que mesmo uma bifurcação "sem estado" requer um certo apoio dos usuários existentes.

Cenário Quatro: Mineradores juntam-se à nova cadeia mas impedem o EIP-1559

Como analisamos, qualquer tentativa de criar uma moeda concorrente está basicamente condenada ao fracasso. Isso deixa outra possibilidade, que é a opção mais discutida atualmente pelos mineradores. Nesse caso, os mineradores se juntarão aos usuários em uma nova blockchain, mas depois controlarão a basefee para zero para suprimir o mecanismo EIP-1559 que queima ETH.

O funcionamento deste método é o seguinte: o controlador EIP-1559 determina a basefee do próximo bloco observando o tamanho do bloco anterior. Se o bloco anterior exceder o limite de gas alvo (50% do limite máximo de gas), a basefee aumentará para limitar a demanda por transações. Se estiver abaixo do limite de gas alvo, a basefee diminuirá para incentivar a demanda.

Os mineradores podem controlar tecnicamente o número de transações que incluem, o que lhes permite controlar o tamanho do bloco e, por conseguinte, controlar a basefee. Se os mineradores apenas minerarem blocos que estão menos da metade cheios, a basefee nunca aumentará acima de zero, portanto, não queimará quaisquer taxas. No entanto, a concorrência entre diferentes mineradores torna essa estratégia difícil de realizar na prática.

Suponha que um pool de mineração com 5% de poder de hash tente implementar essa estratégia, minerando apenas blocos meio cheios ou menores (mesmo que a demanda supere muito esse nível). Ao mesmo tempo, os outros 95% do poder de hash minerarão blocos maiores, obtendo mais receita com as taxas, enquanto a basefee aumentará de qualquer forma. O pool de mineração que controla 5% do poder de hash logo perceberá que está sofrendo perdas, tendo que escolher entre desistir ou perder poder de hash. Isso indica que, enquanto houver concorrência, mineradores egoístas tenderão a incluir o maior número possível de transações.

E se a concorrência diminuir? Suponha que 60% dos mineradores concordem em implementar essa estratégia. O resultado ainda será o mesmo, pois 60% dos mineradores da aliança minerarão blocos meio cheios, enquanto os restantes 40% minerarão blocos completos e obterão toda a receita extra das taxas de congestionamento e MEV. Assim, a basefee ainda aumentará ao longo do tempo, por isso chamamos isso de aliança instável.

A estratégia só funcionará quando mineradores hostis puderem eliminar a concorrência, tornando impossível para outros minerarem grandes blocos. Ao possuir 60% do poder de hash, eles podem alcançar esse objetivo implementando o que é chamado de bifurcação suave ativada por mineradores (MASF). Essa MASF determinará que blocos acima de meio cheio são inválidos, portanto, 60% dos mineradores devem ignorá-los. Agora, 40% dos mineradores ainda podem tecnicamente minerar blocos maiores, mas 60% deles se recusarão a continuar minerando com base nesses blocos, fazendo com que todas as transações e recompensas de blocos alocadas pela minoria se tornem em vão.

É importante entender que o MASF não é um conceito novo. Hoje, os mineradores já podem formar tais alianças, por exemplo, aumentando as taxas ao limitar o limite de gas, cobrando taxas mais altas em grandes transações ou estabelecendo um preço mínimo. Todas essas estratégias parecem mais lucrativas no início, mas os mineradores têm razões suficientes para não tentar.

Primeiro, eles precisam da cooperação de muitas partes que não confiam umas nas outras, o que é difícil de conseguir. Mais importante, o MASF será um ataque sem precedentes à rede Ethereum e seus usuários. Isso não apenas prejudicará a estabilidade da rede a nível de consenso, mas também afetará a confiança dos usuários no Ethereum. Isso já ameaçou as receitas futuras de mineração, mas os usuários também podem reagir de forma mais ativa. Por exemplo, esperamos que os usuários comecem a transmitir transações diretamente para pools de mineração amigáveis, a fim de deduzir taxas e MEV dos pools de censura.

Em suma, para os mineradores que não implementaram o MASF, a manipulação da basefee não é um equilíbrio estável. Mas se os mineradores realmente implementarem o MASF, isso será um ataque autodestrutivo sem precedentes ao Ethereum, incluindo, é claro, seus próprios investimentos.

Cenário Cinco: Mineradores se juntam à nova cadeia e implementam com sucesso o EIP-1559

Dado que os resultados dos cenários 1-4 não são ideais, estamos certos de que a melhor opção para os mineradores é colaborar com os usuários.

Mesmo que a receita dos mineradores na nova cadeia diminua (não é garantido), ainda será muito superior aos ganhos de tentar criar uma moeda concorrente. Qualquer moeda concorrente desse tipo em relação ao ETH terá um valor próximo de zero, não gerará taxas de transação devido a congestionamentos, nem gerará MEV devido a oportunidades de arbitragem DeFi.

Além disso, a implementação do MASF para conter a basefee será um ataque sem precedentes à transparência do Ethereum e de seus usuários. Nunca vimos esse tipo de ataque na prática, e isso tem razões bem fundamentadas. Ele pode prejudicar a confiança dos usuários e o valor do ETH, assim como a atividade econômica no sistema, prejudicando diretamente os interesses dos mineradores.

Compromissos Possíveis

Além dos 5 cenários acima mencionados, também discutimos as diferentes concessões que os usuários podem fazer para apaziguar os mineradores, principalmente incluindo:

• Aumentar a recompensa em bloco da nova cadeia para compensar os mineradores pela perda causada pela queima da basefee;
• EIP-969: Alterar o algoritmo PoW do Ethereum para excluir mineradores ASIC da rede;
• Distribuir a basefee aos mineiros dos próximos N blocos, em vez de queimar.

No entanto, reiteramos que a colaboração com os usuários para atualizações já está alinhada com os melhores interesses dos mineradores. Assim, os usuários não precisam atender às exigências dos mineradores, nem fazer quaisquer concessões adicionais.